Coisa julgada
RECURSOS. ELEIÇÃO 2020. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL – AIJE. PARCIALMENTE PROCEDENTE. ABUSO DE PODER POLÍTICO E PRÁTICA DE CONDUTA VEDADA. APLICAÇÃO DE MULTA. UTILIZAÇÃO DE LOCAL PÚBLICO E DE SERVIDORES. MATÉRIA JÁ ANALISADA EM AÇÃO PRETÉRITA. COISA JULGADA. DOAÇÃO DE IMÓVEIS PÚBLICOS E REPASSE DE VERBAS. EXISTÊNCIA DE LEIS AUTORIZADORAS DAS CONCESSÕES. REPASSE À ASSOCIAÇÃO CARNAVALESCA. FATO INCONTROVERSO. MANUTENÇÃO DE PLACA CONTENDO PUBLICIDADE E PUBLICAÇÃO DE VÍDEOS NA PÁGINA DA PREFEITURA DURANTE O PERÍODO PROIBIDO. CONDUTAS VEDADAS CARACTERIZADAS. AFRONTA AOS ART. 73, INC. VI, AL. B, E 74 DA LEI N. 9.504/97. AUSÊNCIA DE GRAVIDADE A CONSTITUIR ABUSO DE AUTORIDADE. MULTA APLICADA EM SEU PATAMAR MÍNIMO. PUBLICIDADE NA ENTREGAS DE ALIMENTOS E INSUMOS. CONTEXTO DA PANDEMIA CAUSADA PELA COVID–19. AUTORIZAÇÃO PERMITIDA PELA EMENDA CONSTITUCIONAL N. 107/20. NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO INTERPOSTO PELA COLIGAÇÃO. PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO DA CANDIDATA.
1. Insurgência contra sentença que julgou parcialmente procedente ação de investigação judicial eleitoral – AIJE, ajuizada em face de candidatos a prefeita e vice–prefeito reeleitos nas eleições de 2020, para reconhecer a prática de condutas vedadas em período eleitoral e promoção pessoal de autoridades, condenando a mandatária ao pagamento de multa.
2. Utilização de local público e servidores para realização de propaganda eleitoral. Violação ao art. 73, incs. I e III, da Lei n. 9.504/97. Fato idêntico, inclusive com os mesmos vídeos que ilustram o presente recurso, com petição inicial e igual pedido para aplicação de multa e cassação de diploma e registro, foi objeto da AIJE n. 0600716–47.2020.6.21.0110, com resultado pela improcedência da ação e trânsito em julgado. No caso, há a formação da coisa julgada, pois há identidade de demandas com a correspondência entre pedido e causa de pedir, sendo desnecessária a identidade de partes nos casos de legitimação extraordinária, autônoma, concorrente e disjuntiva, prevista na legislação eleitoral, como é o caso das ações de investigação judicial. Nesse contexto, é inteiramente aplicável ao direito processual eleitoral a regra do processo coletivo, mais especificamente da tutela dos direitos difusos e coletivos, quanto à coisa julgada. Assim, aplicando–se a regra disposta no art. 103, inc. I, primeira parte, do Código de Defesa do Consumidor (artigo que disciplina os efeitos da coisa julgada para todas as ações coletivas, relativas não só aos direitos do consumidor, mas também a toda e qualquer espécie de tutela coletiva a interesses difusos ou coletivos), depreende–se que a coisa julgada formada com o trânsito em julgado daquela decisão opera efeitos erga omnes, não havendo mais possibilidade de se rediscutir os fatos expostos agora nesta AIJE.
3. Doação de imóveis públicos e repasse de verba a entidades privadas em ano eleitoral, em desacordo com art. 73, inc. IV e § 10, da Lei n. 9.504/97. No caso, em 2020, foram apenas sancionadas leis autorizadoras das concessões, o que não se confunde com distribuição gratuita de bens e serviços, mormente porque as referidas leis só entram em vigor em 2021, sendo incabível conferir interpretação ampliativa às normas restritivas de direito, como é o caso da vedação do artigo citado. Não se pode responsabilizar exclusivamente a prefeita pela elaboração de lei, quando sabidamente a edição de qualquer lei é precedida de atos de negociação, de arranjo político entre os diversos interesses presentes em uma casa legislativa. 3.1. Quanto à cessão de direito real de uso à Corsan, resta incontroverso nos autos o caráter de continuidade administrativa, em relação aos serviços públicos fornecidos. A mesma lógica deve ser aplicada quanto à cessão destinada ao Corpo de Bombeiros, haja vista o caráter essencial dos serviços públicos prestados. 3.2. Repasse à associação carnavalesca. Cabimento à defesa da prefeita comprovar qual o programa de governo que previa o repasse, ônus do qual não se desincumbiu, caracterizando a conduta vedada pelo art. 73, § 10, da Lei n. 9.504/97. Acontecimento destituído de gravidade suficiente para constituir abuso de autoridade e ser sancionado com a cassação do diploma ou registro, vez que se tratou de fato isolado, sem comprovação de envolvimento pessoal e do intuito eleitoreiro da prefeita.
4. Afronta aos arts. 73, inc. VI, al. “b”, e 74 da Lei n. 9.504/97 e 37, § 1º, da Constituição Federal. Para a proteção dos princípios da impessoalidade e publicidade e do direito fundamental à informação, insculpidos no art. 37, caput e § 1º, da Constituição Federal, as condutas em exame devem ser analisadas sob a ótica tanto da publicidade institucional vedada nos três meses que antecedem ao pleito, descrita no art. 73, inc. VI, al. “b”, da Lei 9.504/97, de viés objetivo e cujo preceito sancionatório está disposto no § 4º do mesmo dispositivo legal, quanto do abuso de poder pela exacerbada promoção pessoal, cuja sanção vem encampada no art. 74 da Lei n. 9.504/97. No caso, a fotografia juntada não deixa dúvida sobre a manutenção da placa que marcou a inauguração da obra, ocorrida em 2018, contendo publicidade institucional, na qual consta o nome da atual mandatária, candidata à reeleição de 2020, além do prazo permitido pela norma de regência. Da mesma forma, demonstrada a publicação de vídeos na página da prefeitura, divulgados à população e mantidos no perfil da administração pública durante período vedado pela legislação. Assim, tratando–se de publicações em período eleitoral, certo é que a candidata incorreu na prática da conduta vedada combatida pelo art. 73, inc. VI, al. “b”, da Lei n. 9.504/97. Contudo, de acordo com o que consta dos autos, não existem elementos aptos a caracterizar o abuso de poder, pela promoção pessoal, em publicidade institucional.
5. Por outro lado, não há que se falar em ocorrência de publicidade institucional, tampouco abuso de autoridade e promoção pessoal nas demais publicações do perfil, não sendo suficiente para tal a presença de divulgação de atos oficiais, o comparecimento em atos de agenda da chefe do Poder Executivo e o alcance de obras e bens à população. 5.1. Publicidade de entrega de alimentos e insumos no contexto da pandemia causada pela Covid–19. A Emenda Constitucional n. 107/20 permitiu a autorização de realização de publicidade institucional no período vedado, independentemente de necessidade de reconhecimento pela Justiça Eleitoral, quando relacionada ao enfrentamento da pandemia. A prova carreada aos autos consiste em sete postagens feitas na página oficial da prefeitura no Facebook entre março e abril de 2020. Publicações insuficientes para comprovar irregularidades no fornecimento de EPIs aos profissionais de saúde, com propósito de obter vantagem em benefício da reeleição. As publicações foram feitas quando a sociedade civil começou a ser mais fortemente impactada pelos efeitos da pandemia de coronavírus, causados pela suspensão de atividades em diversos setores econômicos, exigindo ações e programas ostensivos dos poderes públicos no atendimento das demandas sociais, especialmente em relação aos profissionais da saúde. 5.2. Inexiste afronta ao art. 37, § 1º, da Constituição Federal o fato de bloco carnavalesco ter agradecido à prefeita pela cessão de área para desenvolvimento de suas atividades culturais, tampouco se cogita abuso de autoridade a publicação do evento em perfil da prefeitura no Facebook. Não há elementos nos autos que indiquem que o bloco carnavalesco tenha dedicado suas atividades do carnaval de 2020 a homenagear a pessoa da mandatária. Da mesma forma, não se configura conduta vedada a veiculação das mesmas postagens no perfil próprio da candidata nas redes sociais. A publicidade de suas realizações como prefeita, em seu perfil particular no Facebook, constitui atividade lícita de campanha eleitoral, que não ultrapassa a fronteira da mera promoção pessoal, prerrogativa inerente à livre manifestação do pensamento, em meio, aliás, acessível a todos os candidatos.
6. Seguindo a linha adotada pelo Tribunal Superior Eleitoral, para resguardar o princípio de individualização da pena, não deve ser aplicada a cassação sempre que configurado o ilícito em questão, mas somente em situações onde a conduta esteja revestida de maior gravidade, o que não ocorre no caso presente. As condutas não fazem menção expressa ao pleito e não evidenciam em seu conjunto a prevalência do personalismo do agente público sobre o caráter educativo, informativo ou de orientação social da publicidade. Assim, não merece acolhimento o pleito pela cassação do registro e diploma e declaração de inelegibilidade dos representados, sendo o caso, apenas, de aplicação da pena de multa, razoável em seu patamar mínimo, fixada para cada uma das oito condutas praticadas, pois ausentes circunstâncias que representem maior juízo de reprovabilidade. A extensão da condenação à multa ao vice–prefeito não foi objeto do recurso e, por consequência, não será analisada, nos termos do art. 1.013, caput, do CPC, sob pena de violação ao princípio do tantum devolutum quantum appellatum.
7. Provimento negado ao recurso da coligação. Parcial provimento ao recurso da candidata. Reduzido o montante da multa aplicada.
RECURSO. ELEIÇÕES 2020. AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE MANDATO ELETIVO – AIME. IMPROCEDENTE. INEXISTÊNCIA DE LITISPENDÊNCIA. FATO NOVO. PRELIMINAR. CERCEAMENTO DE DEFESA POR INDEFERIMENTO DE PROVA PERICIAL. REJEITADA. MÉRITO. PRÁTICA DE ABUSO DE PODER ECONÔMICO E CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. AUSÊNCIA DE PROVA FIRME E CONTUNDENTE. MANTIDA A SENTENÇA. DESPROVIMENTO.
1. Insurgência contra sentença que julgou improcedente ação de impugnação de mandato eletivo ajuizada em desfavor de candidatos eleitos aos cargos de prefeito, vice–prefeito e de vereador, em virtude da inexistência de prova idônea e contundente de abuso do poder econômico, corrupção ou fraude.
2. Inexistência de litispendência. O TSE passou a admitir o reconhecimento de litispendência e coisa julgada entre AIJE e AIME quando há identidade entre a relação jurídica–base das demandas, o que deve ser apurado a partir do contexto fático–jurídico do caso concreto. No caso, a presente AIME deduz um fato novo em relação à AIJE anterior, envolvendo suposta coação de colaboradores, fato suficiente para que seja afastada eventual coisa julgada.
3. Afastada a preliminar de cerceamento de defesa por indeferimento de prova pericial em aparelhos celulares. A medida requerida, sobremodo invasiva à intimidade e à privacidade, não poderia ser autorizada com fundamento em mero relato, não corroborado por outros elementos mais seguros de prova quanto à existência do ato ilícito, e que foi prestado por pessoa filiada à agremiação, que figura no feito como impugnante.
4. Matéria fática. Alegação de treze fatos que supostamente caracterizariam ilícitos eleitorais. Porém, todos sem aptidão para configurar abuso de poder ou captação ilícita, os quais reclamam contundente conjunto probatório. De acordo com o entendimento do TSE, o abuso do poder econômico caracteriza–se pelo emprego desproporcional de recursos patrimoniais (públicos ou privados), com gravidade suficiente para afetar o equilíbrio entre os candidatos e macular a legitimidade da disputa. Imprescindível, para afastar legalmente determinado mandato eletivo obtido nas urnas, que a Justiça Eleitoral, mediante provas robustas, verifique a existência de grave abuso de poder, suficiente para ensejar as rigorosas sanções de cassação do registro, diploma ou mandato e inelegibilidade, o que não é o caso dos autos.
5. Para a configuração do ilícito previsto no art. 41–A da Lei n. 9.504/97, a promessa de vantagem em troca de voto deve ser pessoal, correspondendo a benefício a ser obtido concreta e individualmente por eleitor determinado ou determinável, o que não ocorre nas condutas relatadas.
6. Ausência de demonstração da prática de abuso do poder, fraude ou corrupção por prova firme e contundente. Confirmada a sentença que julgou improcedente a ação.
7. Desprovimento.
RECURSO. ELEIÇÕES 2020. TUTELA DE URGÊNCIA. EFEITO SUSPENSIVO AUTOMÁTICO. REGISTRO DE CANDIDATURA INDEFERIDO. AUSENTE QUITAÇÃO ELEITORAL. ART. 11, § 1º, INC. VI, E § 7º, DA LEI N. 9.504/97. CONTAS ELEITORAIS DE 2016 JULGADAS COMO NÃO PRESTADAS. COISA JULGADA. APRESENTAÇÃO POSTERIOR. RESTRIÇÃO QUE PERSISTE ATÉ O FINAL DA LEGISLATURA. RESOLUÇÃO TSE N. 23.463/15 E SÚMULA TSE N. 42. DESPROVIMENTO.
1. Insurgência contra sentença que indeferiu o pedido de registro de candidatura por ausência de certidão de quitação eleitoral, conforme exigido pelo art. 11, § 1º, inc. VI, e § 7º, da Lei n. 9.504/97. Circunstância decorrente do julgamento como não prestadas das contas relativas à eleição de 2016.
2. Pedido de tutela de urgência deferido sem a concessão de certidão, pois ressalvado o efeito suspensivo automático, ínsito aos recursos contra decisão em requerimentos de recurso de candidatura.
3. A decisão que julga não prestadas as contas de campanha impede o candidato de obter a certidão de quitação eleitoral durante o curso do mandato ao qual concorreu. A apresentação posterior das contas servirá apenas para que a restrição não persista após o final da legislatura, conforme art. 73, inc. I e § 1º, da Resolução TSE n. 23.463/15. Na mesma esteira, a Súmula TSE n. 42.
4. O processo de registro de candidatura não é o meio adequado para discutir eventuais vícios no processo de prestação de contas transitada em julgado. Nesse sentido, a inteligência da Súmula n. 51 do TSE. Não preenchida a condição de elegibilidade prevista no art. 11, § 1º, inc. VI e § 7º, da Lei 9.504/97.
5. Desprovimento.