Astreintes
AGRAVO DE INSTRUMENTO. IMPUGNAÇÃO IMPROCEDENTE. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. DESCUMPRIMENTO DE ORDEM JUDICIAL. ASTREINTE. CONTROVÉRSIA SOBRE O TERMO INICIAL DE INCIDÊNCIA DE CORREÇÃO MONETÁRIA. MULTA COMINATÓRIA. QUANTUM CONDENATÓRIO EM CONFORMIDADE. DESCABIDA CONDENAÇÃO POR LITIGÂNCIA DE MÁ–FÉ. PARCIAL PROVIMENTO.
1. Insurgência contra decisão que, em sede de cumprimento de sentença, rejeitou impugnação por alegado excesso de execução. Condenação de multa por litigância de má–fé. Aduzido que “a data de incidência da correção monetária sobre o débito deve ser a data de publicação do comando judicial que redimensionou definitivamente a multa”, e não as respectivas datas de incidência, como entendeu o juízo a quo. Recurso recebido no duplo efeito, ante a plausibilidade dos argumentos e do risco de medidas de constrição patrimonial.
2. Controvérsia sobre termo inicial de incidência da correção monetária sobre a multa cominatória diária fixada por descumprimento de ordem judicial que determinou a remoção de vídeo divulgado na internet. Consolidado na jurisprudência que o termo inicial de incidência da correção monetária sobre as astreintes é a data do seu arbitramento, considerado como a última decisão que fixa o seu valor ou que o redimensiona. Dessa forma, no momento em que o Tribunal modifica o valor aplicado, tem–se em consideração o valor atual da moeda e o tempo decorrido entre a decisão reformada e o acordão, não havendo necessidade de recomposição das perdas inflacionárias havidas nesse interstício, de modo que a incidência de correção monetária somente encontra fundamento a partir da decisão que altera definitivamente a quantia devida até o efetivo pagamento.
3. No caso dos autos, o TSE não modificou o valor da multa cominatória estabelecido pelo acórdão deste Tribunal, mas tão somente o termo final em relação ao qual se poderia caracterizar a desobediência da agravante, havendo, por consequência, a diminuição do somatório total de modo reflexo, em razão da redução do número de dias nos quais ocorrida a recalcitrância da empresa. Logo, a decisão do TSE não alterou a dosimetria financeira da multa diária cominada, cuja fixação é o que determina o marco de incidência da correção monetária, de modo que irreparável a decisão agravada quanto à análise do ponto.
4. O acórdão deste Tribunal Regional Eleitoral, embora tenha promovido a adequação da quantia diária estabelecida pelo juízo de primeiro grau, expressamente retrocedeu a dosagem à data da sentença na análise da matéria, ou seja, procedeu à revisão conforme o poder econômico da moeda ao tempo da decisão reformada e definiu aquela data como termo de incidência da correção monetária. Dessa forma, a reavaliação do quantum condenatório ocorreu em conformidade com os parâmetros econômicos existentes na época da decisão original, tornando sem embasamento a pretensão de atualização da moeda em data diversa.
5. Descabida a condenação da empresa então impugnante por litigância de má–fé com fulcro no art. 80 do CPC. O simples exercício do direito de ação (impugnação) e de interposição recursal, a partir de entendimento razoavelmente articulado sobre os termos das decisões anteriores em confronto com os parâmetros jurisprudenciais de incidência da correção monetária não configura, no contexto dos presentes autos, conduta de má–fé ou de temeridade processual. 6. Parcial provimento. Afastada a multa por litigância de má–fé.
AGRAVO INTERNO. MANDADO DE SEGURANÇA. LIMINAR DEFERIDA. MATÉRIA PRELIMINAR. NULIDADE PROCESSUAL. INADEQUAÇÃO DA VIA. OFENSA AO CONTRADITÓRIO E À AMPLA DEFESA. AUSÊNCIA DE INTERESSE. MÉRITO. FACEBOOK. FORNECIMENTO DE CONTEÚDO DE POSTAGENS REMOVIDAS PELO USUÁRIO. INVIÁVEL. AUSENTE PEDIDO DE PRESERVAÇÃO DA PROVA. PROVIMENTO NEGADO AO AGRAVO INTERNO. CONCESSÃO DA SEGURANÇA.
1. Mandado de segurança pleiteando a concessão de ordem para suspender decisão proferida em autos de Ação de Investigação Judicial Eleitoral - AIJE, em trâmite no juízo de primeiro grau, que havia determinado a provedor da internet, em sede de tutela provisória de urgência, o fornecimento de postagens específicas, especialmente algumas já removidas, sob pena de aplicação de multa diária (astreintes).
2. Nulidade processual por ausência de citação como litisconsorte passivo necessário. Na hipótese, seria o caso de reconhecer a existência do litisconsórcio passivo necessário para fins de integrar à lide a coligação agravante. No entanto, embora feita a ressalva, não vislumbrado prejuízo no prosseguimento da análise do mandado de segurança, dado o ingresso da coligação no processo, por meio do agravo interno interposto, de forma que eventual vício resta sanado.
3. Considerados os estreitos limites da cognição em mandado de segurança, descabida a controvérsia acerca da necessidade da prova, de sua suficiência ou de interesse processual, no cumprimento da ordem judicial atacada, elementos constantes na inicial do writ. Ainda que se considere a admissão do impetrante como terceiro interessado na Ação de Investigação Judicial Eleitoral, a necessidade ou a valoração da prova no processo de conhecimento não podem ser objeto do mandado de segurança. Quando muito, admite-se a discussão de cerceamento de defesa pelo indeferimento de provas, mas não se cogita de tutelar a instrução probatória, ao examinar se uma ou outra modalidade de prova é útil ou necessária ao processo, visto que demandaria conhecimento exauriente dos elementos dos autos originários e ampla análise do pedido contido na ação em trâmite na primeira instância, o que é incompatível com a própria natureza do mandamus e subtrai a competência do juiz que conduziu a ação na qual foi proferida a decisão atacada.
4. Desnecessário, igualmente, o exame da proteção da intimidade ou inviolabilidade do sigilo das comunicações, visto que o objeto da requisição são conteúdos em rede social onde não se evidencia, aparentemente, qualquer caráter limitativo à visualização. Trata-se de postagens públicas, e não de troca de mensagens privadas entre usuários de aplicação de internet.
5. Discussão delimitada ao aspecto de ter ou não o impetrante o dever legal de encaminhar ao juízo solicitante as postagens, especialmente as removidas, publicadas em dois perfis pessoais, nas redes sociais Instagram e Facebook, bem como ao cabimento da fixação de astreintes.
6. Nos termos do art. 373 do Código de Processo Civil, o ônus da prova incumbe ao autor quanto ao fato constitutivo de seu direito, sendo que a existência e o modo de existir de algum fato podem ser atestados ou documentados mediante ata lavrada por tabelião, onde constarão também dados representados por imagens e sons gravados em arquivos eletrônicos (ex vi do art. 384 do mesmo Código). Disposições que caminham ao lado das previsões da Resolução TSE n. 23.608/19, as quais, no tocante às representações fundadas no art. 96 da Lei n. 9.504/97, determinam que a petição inicial da ação relativa à propaganda irregular será instruída, sob pena de não conhecimento, no caso de manifestação em ambiente de internet, com a identificação do endereço da postagem (URL ou, caso inexistente esta, URI ou URN), prevendo, também, que a prova seja feita por qualquer meio admitido em direito, não se limitando à ata notarial, cabendo ao órgão judicial competente aferir se ficou demonstrada a efetiva disponibilização do conteúdo no momento em que acessada a página da internet. Embora, na hipótese em análise, não se esteja diante de representação, evidente que o ônus da prova da existência da publicação caberia ao autor, pois, na espécie, não se vislumbra peculiaridade a justificar a impossibilidade ou a excessiva dificuldade de cumprir o encargo.
7. O Marco Civil da Internet (Lei n. 12.965, de 23 de abril de 2014) limitou a responsabilidade dos provedores de aplicações de internet, estipulando prazos para o armazenamento de dados e prevendo que sejam mantidos os registros de acesso a aplicações de internet (art. 15) e, caso requerido, disponibilizados os registros de conexão ou de acesso a aplicações de internet (art. 22). Dispositivos que definem quais informações devem ser mantidas e, por consequência, fornecidas sob ordem judicial pelos provedores de aplicação. A enumeração desses dados está relacionada à necessidade de obtenção de meios para que se possa, eventualmente, identificar usuários, coibindo o anonimato e atribuindo autoria certa e determinada a cada manifestação. Os registros de conexão e de acesso a aplicações são informações essenciais para permitir a localização do terminal e do indivíduo que o utilizava para a perpetração de ilícitos na internet. Isto é, o Marco Civil da Internet obriga a guarda desses dados objetivando possibilitar a identificação de usuários da internet pelas autoridades competentes, mediante ordem judicial.
8. De acordo com os dados públicos divulgados pelo Portal de Estatísticas e Infográficos Statista, o grupo Facebook, com os aplicativos Instagram, WhatsApp, Messenger e aquele que dá nome à empresa, tinha, somados, até o ano de 2020, aproximadamente, 3,45 bilhões de usuários no mundo todo. Para manter o sistema funcionando, de forma que todo esse contingente possa realizar postagens e interagir com o conteúdo em rede, a empresa cria regras claras, denominadas termos de uso da aplicação. Quando um usuário exclui os dados que publica no Facebook, eles serão, via de regra, eliminados imediatamente. As exceções para manutenção, nos servidores do Facebook, do conteúdo excluído pelo usuário estão listadas no próprio texto, sendo a mais comum a ordem judicial para preservação de provas. Entretanto, as partes que litigam em processo em que existam provas digitais a serem utilizadas devem ser diligentes, providenciando o registro bilateral dos documentos por meio de atas notariais, carimbo de tempo com assinatura digital, ou, ainda, valendo-se do armazenamento nos bancos de dados da tecnologia blockchain, porque, uma vez apagadas, não há como recuperar tais provas.
9. Eventual disposição judicial determinando ao Facebook que mantenha o conteúdo de todos os usuários por certo período de tempo, mesmo após o desejo de exclusão efetivado pelo titular dos dados, acarretaria ônus ilegal imposto à empresa, pois, além de violar a Lei Geral de Proteção de Dados - LGPD, geraria obrigatoriedade de vultoso investimento financeiro com a instalação de bancos para grande volume de dados, além dos já existentes, para manter os dados que a lei a obriga a preservar.
10. No caso concreto, pretende-se que o provedor de aplicações forneça informações que ele não detém, ou por terem sido apagadas pelo titular, ou por não lhe ter sido previamente determinada a preservação. Poderia o autor da ação de investigação ter requerido a conservação das provas. Não tendo sido tomadas tais providências, inviável recuperar o que já tenha sido excluído do ambiente digital, tornando-se em obrigação impossível ao ora impetrante. Assim, com fundamento nos arts. 15 e 22 da Lei n. 12.965/14, o impetrante não pode ser obrigado a fornecer dados diversos dos registros de conexão ou de registros de acesso a aplicações de internet. No entanto, cabível a solicitação de fornecimento de todos os dados disponíveis sobre usuários determinados, caso o julgador entenda pertinente e na forma da lei, mas sem impor que o provedor comprove que não possui (prova negativa) informações além daquelas estipuladas legalmente.
11. A natureza da multa aplicada nos autos é de astreintes, instrumento processual utilizado com a finalidade de coagir ao cumprimento do fazer ou do não fazer, não tendo caráter punitivo". Facultado ao juiz, determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, nos termos do art. 139, inc. IV, do CPC. Entretanto, sendo inexigível o fornecimento de dados diversos dos registros de conexão ou de acesso a aplicações de internet, também não remanesce a multa pelo descumprimento da ordem judicial.
12. Provimento negado ao agravo interno. Concessão da segurança.
RECURSO. ELEIÇÃO 2020. REPRESENTAÇÃO PROCEDENTE. PROPAGANDA ELEITORAL IRREGULAR. PROMOÇÃO DE CARREATAS. SEGURANÇA DA COMUNIDADE. ADOÇÃO E OBSERVÂNCIA DOS PROTOCOLOS SANITÁRIOS. RAZOABILIDADE E CAUTELA NO EXERCÍCIO DO PODER DE POLÍCIA. ASTREINTES. REFORMA EM PARTE DA SENTENÇA. PARCIAL PROVIMENTO.
1. Insurgência contra sentença que julgou procedente representação por propaganda eleitoral irregular. Confirmada liminar e determinado aos requeridos que se abstenham da promoção de novas carreatas, ou mesmo de acompanhamentos de carros, sob pena de multa diária à coligação e aos candidatos.
2. Ainda que a legislação eleitoral não proíba a promoção de carreatas, mesmo em face do excepcional cenário decorrente da pandemia da COVID-19, a realização de tais atos de campanha necessita de determinados cuidados, garantindo-se a segurança da comunidade com a adoção e observância dos protocolos sanitários.
3. Objetivando compatibilizar o direito dos candidatos na realização de suas campanhas, com as cautelas que o momento e a situação de saúde pública exigem, foram editadas normas que não impedem a promoção de carreatas mas recomendam que sejam evitadas. Caso ocorram, deverão ser adotadas todas as medidas necessárias à manutenção do distanciamento físico entre as pessoas, evitando-se aglomerações.
4. O exercício do poder de polícia deve se restringir ao prescrito em lei, vedado estabelecer limitações onde a norma não as prevê, no intuito de evitar eventuais abusos. Impõe-se observar a razoabilidade e cautela no exercício do direito.
5. A Resolução TSE n. 23.608/19, em seu art. 54, § 2º, veda a imposição de astreintes no exercício do poder de polícia. Contudo, no caso, excepcionalmente, o valor imposto cumpre a finalidade a que se dispõe, estando adequada e proporcional ao bem jurídico que pretende proteger.
6. Reforma, em parte, da sentença. No caso de eventual realização de evento dessa natureza, cumpram-se as regras estabelecidas.
7. Parcial provimento.
RECURSO ELEITORAL. AGRAVOS DE INSTRUMENTO. JULGAMENTO CONJUNTO. PESSOA JURÍDICA. GOOGLE. UNIÃO. EXCESSO DE EXECUÇÃO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. ASTREINTES. IMPUGNAÇÃO ACOLHIDA PARCIALMENTE. PRELIMINAR DE NULIDADE ACOLHIDA EM PARTE, MAS POR FUNDAMENTAÇÃO DIVERSA. MÉRITO. VALIDADE DA ATA NOTARIAL JUNTADA AOS AUTOS. POSSIBILIDADE DE READEQUAÇÃO DA MULTA VENCIDA. PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE DO VALOR. ÍNDICE DE CORREÇÃO MONETÁRIA APLICÁVEL. PARCIAL PROVIMENTO.
1. Agravos interpostos contra decisão de primeiro grau que acolheu parcialmente a impugnação proposta pela empresa, em fase de cumprimento de sentença, a fim de reconhecer excesso de execução e estabelecer a data da diplomação como termo final da incidência de astreintes fixadas em representação por propaganda eleitoral negativa na internet. Penalidade aplicada diante do descumprimento de decisão judicial que determinou a retirada de propaganda irregular do canal YouTube.
2. Peliminar suscitada pela União. Nulidade da decisão agravada. Alegada preclusão para o Juízo a quo estabelecer o termo final para a incidência das astreintes na data da diplomação. Acolhida em parte a prefacial, por fundamento diverso, em razão do entendimento de que a incidência das astreintes deve ser considerada até a data em que provado o cumprimento da ordem judicial de remoção da propaganda da internet.
3. Mérito. Validade da ata notarial. A teor do art. 384 do CPC/2015, a ata notarial consiste em prova destinada a atestar a existência de dados representados por imagem ou som gravados em arquivos eletrônicos. No caso, o endereço de internet contido na ordem de retirada da publicidade é exatamente o mesmo indicado na ata notarial. Correto o apontamento de que, em 21.8.2014, a propaganda irregular permanecia acessível na internet, merecendo ser refutada a impugnação da ata notarial porque desprovida de fundamento idôneo. Dessa forma, ainda que se desconheça o dia em que a decisão judicial foi efetivamente cumprida pela executada, deve ser o dia 21.8.2014 considerado como termo final da incidência das astreintes objeto do cumprimento de sentença.
4. Possibilidade de readequação de multa vencida. O Superior Tribunal de Justiça, na égide do Novo Código de Processo Civil, reafirmou o entendimento no sentido de que é possível ao julgador, nos termos do art. 537, § 1º, inc. I, do citado normativo, alterar, de ofício ou a requerimento da parte, o valor da multa quando este se tornar insuficiente ou excessivo, mesmo depois de transitada em julgado a sentença. A jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral admite o exame do valor fixado a título de multa cominatória, quando ínfimo ou exagerado, a fim de adequá-la aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. Mantido entendimento firmado por esta Corte, pela possibilidade de alteração do valor de astreintes vencidas.
5. Admitida a revisão do valor da multa cominatória, impõe-se a definição dos parâmetros de avaliação da sua proporcionalidade e razoabilidade. Neste sentido, à vista das perculiaridades do caso concreto, principalmente face a capacidade econômica da parte agravante, determinada apenas a redução do quantum do aumento das astreintes fixado em sentença.
6. A Resolução TSE n. 21.872/04 determina a adoção do Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial, como fator de atualização monetária aplicável na fase executiva.
7. Acolhida em parte a preliminar suscitada e, no mérito, dado parcial provimento aos agravos de instrumentos interpostos, para reformar parcialmente a decisão agravada, a fim de fixar o termo final do período de incidência das astreintes, reduzir o valor do aumento determinado em sentença e estabelecer a correção do débito com base no IPCA-E.